Coisas do sangue
Agora dei para desconversar sobre
a solidão. Percebi isso há pouco, conversando com uma amiga. Des-conversar, não
conversar, sobre a solidão. Talvez porque eu seja já a solidão. Agora, pensando
neste momento sobre isso, enquanto escrevo, penso que não estou mais me sentindo
só, pois que já sou a própria solidão. Ela é tão eu e eu sou tão ela que falar
sobre, é muito difícil. Falar sobre algo que nos acomete talvez seja mais
fácil. E falar da solidão não é falar sobre algo que me acomete, não me sinto mais
só, pois que sou a solidão. Não mais a vejo, é como estar na água e por isso
não ver a água, ou como o sangue que corre em nossas veias e não o vemos, nem
mesmo pensamos ou falamos sobre ele, somos o nosso sangue. A solidão sou eu
como sou meu sangue. Não entendo do sangue, não sei direito do que se
constitui, como se movimenta, precisaria estudar biologia, bioquímica, sei lá. Sei
que não me interesso em saber sobre o meu sangue, nem mesmo fazer aqueles
exames enormes que classificam e dizem tudo sobre como está o sangue, se
estamos com alguma doença, ou precisando de algum medicamento para fortalecê-lo,
para continuarmos vivos. Não me interesso em saber como se constitui a solidão
em mim, e o bom é que da solidão não se faz exames, não temos como saber se
está fraca nem o que precisamos melhorar nela para continuarmos vivos. Talvez
fosse bom sabermos quantificar e classificar a solidão para sabermos como mantê-la
na justa medida da manutenção da vida. Pois é, da solidão não mais me ocupo, não
vejo necessidade, nem vantagem, nem por quê. Talvez por isto tanto des-converso.
Não sei mais falar da solidão, como geralmente não sabemos falar do nosso
sangue. Não sinto mais a dor da solidão, como também não sentimos dor enquanto
nosso sangue percorre nosso corpo. Do nosso sangue só nos damos conta se
falamos sobre ele, da minha solidão também. Talvez tenha me desinteressado
sobre o assunto, não quero saber da minha solidão, do meu ser solidão, nem
fazer exame de sangue. Tenho que viver mesmo, então...é isso. Se algum dia eu ficar
muito doente, provavelmente farei alguns exames de sangue e quem sabe as lâminas
do laboratório indicarão a quantas anda a minha solidão.
Denise Magalhaes
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